terça-feira, 21 de setembro de 2010

Mortinha por contar um momento mágico em Aveiro...




Dá-me a travadinha e lá vou eu armada de expectativas e bagagens (mas poucas), com hotel marcado, rumo a Aveiro. Sítio onde não conheço rigorosamente ninguém mas com a sensação absurda de que tenho lá alguém à minha espera. Claro que não tenho nem à chegada nem à despedida. O que é óptimo para quem não gosta de despedidas. Não é o meu caso, adoro despedidas, choro e tudo. É um hábito saloio que me ficou de infância.
Fica sempre bem dizer que Aveiro é lindíssimo. Eu digo. Tem a ria e tem pessoas muito simpáticas.
Como não tinha cicerone e ficar fechada num quarto de hotel não era o objectivo, há que me meter por ruas e ruelas até me perder. Decorei o caminho do Fórum ao hotel, depois bastava perguntar a alguém onde era o Fórum e assunto resolvido. Calho a perguntar a uma senhora, que não só fez questão de me levar lá, como me acompanhou num café. Trocamos telefones e tudo, sabendo que ninguém ia telefonar a ninguém. O que teríamos para dizer? – Eu tenho, ( um pormenor à parte, estou a escrever isto enquanto aguardo o comboio, com uma caneta que roubei, literalmente, no hotel. Resultado está a ficar sem tinta…), só que não sei como (falo da srª), valorizei tanto a atitude que a palavra obrigado não tem significado. Há um gesto ( o raio da caneta continua a falhar) nos jovens, que é bater no peito com a mão fechada, enquanto dizem:-“ Mano, tás aqui…”- É o que me apetece fazer.
Atenção não foi este o momento mágico. Mas como “só” já faltam duas horas para o comboio, tenho muito tempo para falar dele.
Outro péssimo hábito que me ficou sei lá de onde, é nunca querer saber o horário dos comboios de regresso a casa. Depois acontece-me isto, estou numa estação enorme, rigorosamente sozinha. Excepto quando um altifalante anuncia a atenção á passagem de uma circulação sem paragem, na linha numero um. Por acaso até nem foi isto que anunciou, mas sempre me apeteceu registar esta frase.
Vou fazer uma pausa para tomar um café. Não sei bem onde, Aveiro pára aos domingos. Já volto.
Voltei. Faltam trinta minutos para a chegada do dito. Vou contar o meu momento mágico.
Deixo o hotel às nove da manhã sensivelmente, deserta por repor os meus níveis de cafeína no sangue. Já referi que Aveiro pára aos domingos. Tentar tomar um simples café é uma aventura labiríntica.
Lá descubro uma esplanada fantástica e deserta. Escolho uma mesa sob uma árvore. É-me servido o café duplo e sempre escaldado. Acompanho com o meu cigarro “ Black Devil”.

Agora o momento. A manhã estava cinzenta. E de repente, não mais que de repente, surgida do nada, uma figura vestida de preto, começa a tocar violino. O meu instrumento musical preferido. Uma música linda. É de perder a respiração.
Fecho os olhos para não perturbar o momento. Permaneço imóvel enquanto um desconhecido toca só para mim. Tenho de perturbar o momento e fixo os olhos nos olhos que me fixam e ali ficamos, indeterminadamente, numa sintonia muda.
Quebro a magia, eu tenho de lhe dar o pagamento justo pelo serviço prestado. Não é uma esmola. Quando pego na carteira ele vira-me as costas e afasta-se e sem parar de tocar desaparece.
Absorvo aquele momento lindo. Ele o violonista vestido de preto passou a um nível superior, comparável ao livro inverso do menos bom, (esta frase só faz sentido para quem sabe que eu costumo dizer, que até à data ainda não conheci ninguém, que se comparasse sequer a um livro menos bom).
A felicidade é um somatório de momentos felizes. Graças a ele tenho a adicionar mais um momento.
Muito obrigado meu querido! Para ti o meu abraço sólido…

O comboio está quase a chegar. A estação já não está deserta. Eu sim. Sem ninguém para me despedir.
Congratulo-me com o facto dos comboios actuais não terem janelas de abrir, senão, ainda que não tivesse ninguém a quem acenar, já me estou a imaginar debruçada num Adeus interminável e debulhada em lágrimas.
É eu sou assim…, gosto de despedidas. E choro a caminho de casa e em casa, como se tivesse perdido alguém que nunca tive…

2 comentários:

  1. Magnifico momento, parabéns pelo texto.

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  2. Um anónimo a ler-me também é um momento lindo. 2010, estamos em 2014... volta anónimo, estás perdoado !!! (será que os anónimos recebem notificações?)

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